quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Pais superprotetores



    Imagem: Google

Fui criada entre um pai faz tudo e uma mãe faz nada, para o papai tínhamos que ter liberdade até para cair e levantar, para a mamãe era necessário ficar comportadinha como uma mocinha mesmo sem ser mocinha ainda.
Então uma hora mamãe proibia e papai liberava, outra hora papai liberava e mamãe proibia. É claro que crianças inteligentes sabiam de quem pedir para fazer ou não fazer certas coisas, íamos com o papai se fosse para trepar na árvore e íamos com a mamãe para evitar lavar a louca, podia quebrar um copo né?
A  coisa complicava quando ao invés deles decidirem eles passavam a boa com a terrível frase: pede da sua mãe ou fala com o seu pai, exatamente o oposto do que queríamos e a única alternativa era ter as frustrações nas mãos.
Uma amiga e comadre minha falou que não queria que o filho gostasse de futebol (o menino é louco em vida pelo esporte), para não machucar as pernas e não ficar com as pernas feias, e é exatamente assim que pensam pais superprotetores, nada pode dar errado, nenhum arranhãozinho, nenhuma contrariedade, nenhuma briga na escola.
Alguns pais se pudessem, colocariam seus filhos em roupas de saco bolhas, em carros brindados, comprariam até travesseiros antipesadelos se existissem.
Tem outros pais que vivem a vida dos filhos, escolhem a profissão, querem que eles sejam engenheiros, ou pressionam para a carreira artística, pois eles são fofos cantando ou desfilando, pais que projetam a infância dos filhos da forma como eles queriam a sua infância, pais controladores, decididos, influentes que faz do filho tudo que sonharam para si.
Em algum lugar eu me encaixo aqui, meu pai viveu sem oportunidades, foi para a escola pela primeira vez aos 11 anos, tudo foi muito difícil e sem empurrões, então o que fez conosco? Deu todas as oportunidades possíveis e imagináveis: judô, natação, vôlei, basquete, piano, inglês, jazz, estudos no estrangeiro, só peguei gosto pela dança, minha paixão até hoje, mas as oportunidades e o aprendizado foi útil e disciplinador.
Acho que em casa tinha um equilíbrio, não me sentia sufocada a continuar nada que não quisesse, não me sentia obrigada a gostar de inglês ou de qualquer outra coisa, sinto que o papai jogou muito dinheiro fora enquanto eu não descobria meu talento.
Tinha sonhos inquietantes, parecia que tinha bicho no pé, uma hora em cada lugar, fazendo uma determinada coisa que não tinha nada a ver com a coisa feita na hora seguinte. O que aconteceu comigo? Tirando a dança que eu sou fascinada, nenhum outro talento despertou. Confesso que essas atividades intensas nunca fizeram desordem na minha cabecinha de criança. Acostumei!
Fui crescendo e as coisas foram ficando mais soltas, nunca fui educada sentar direitinho, rigidamente com as penas unidas ou cruzadas, hoje, sou uma adulta que amo saias e vestidos e acabo sentando como se estivesse de calças, para tratar dos fundos aparecendo adotei shortinhos por baixo da roupa.
Na presente situação não sei se tive uma infância bem feliz, fui feliz sim e muito, amava a criatividade do papai que transformava um convite de aniversário de dez palavras em um convite sensacional de palavras, pois a festinha ia ser legal, ia ter sorvete, palhaço, pipoca, brigadeiro, bolo, vela e amigos para brincar, o convite era muito divertido interpretado por papai, amava a proteção e aconselhamentos da minha mãe, mas será que eu poderia ter dedicado meu tempo a não fazer nada, a ler, a jogar vídeo game que eu nunca aprendi? Não penso nisso como algo ruim ou traumático, apenas para entender se é algo bom ou ruim, encher os filhos de atividades complementares.
Na vida escolhi um trabalho não cansativo, formei-me em Secretariado Executivo, longe do curso de direito escolhido pelos meus pais, pronta para trabalhar em escritório, ajudar CEO com minhas ideias mirabolantes, atravessei a ponte e me estabilizei trabalhando para o Governo Estadual. A coisa boa de serviço público é você ter a liberdade de falar exatamente o que pensa pelo bônus da efetividade.
Acho que a pior superproteção é inibir a personalidade natural da criança, querer que ela seja do jeito que você planejou, não me lembro de ter uma vocação desde a infância, quero ser médica quando crescer, ou professora, ou mãe, ou aeromoça (entregando a idade), não me lembro dos meus projetos, mas não estou insatisfeita com o percurso da minha vida, trabalho no que gosto, uso o cérebro e aprendo constantemente.
- Arcise Câmara







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