Foram 23 horas de agonia. Eu moro em
apartamento e quando deixei minha amiga no elevador o gato escapou sem que eu
visse.
Não senti falta na hora, não o vi
sair, estava cansada, trabalhei no dia 24 meio período, fui fazer a comida da
ceia, almocei tarde, lavei um montão de louça e fui dormir. Acordei em cima da
hora e fui à missa de natal.
Quando cheguei senti falta, percebi
que fazia horas que não o via e me desesperei. Desci e subi os dezoito andares
do prédio até não sentir mais minhas pernas, desci e subi chamando o Kadu,
desci e subi com um pote de ração fazendo chocalho, desci e subi miando, desci
e subi em silêncio, desci e subi chorando, desci e subi soluçando, desci e
subi, desci e subi.
Minuciosamente olhei nas garagens,
nas rodas do carro, nos muros e telhados. O porteiro havia visto, mas nem
sequer interfonou para nenhum apartamento para tentar achar o dono. Achei um
despreparo. Mas não quis xingar, ele poderia ainda ver o Kadu e eu não o queria
com raiva de mim.
Andei o quarteirão, rondei uma casa
vizinha em que a dona cria muitos gatos, chorei muito, não dormi, não preguei o
olho, meu natal foi péssimo. Um natal sem natal.
No domingo fui à missa das 11h,
chorei muito, pedi a Deus. Minha mãe me abraçou e com uma grande convicção
disse: não chora você vai encontrar seu gato hoje. Eu sei, eu sinto. Aquela
convicção me convenceu. Tentei ser mais racional e menos emocional.
Verifiquei que o gato não sairia do
prédio sem ser notado, era um gato bem criado, cheiroso, miadeiro e com cara de
quem tem dono. Observei que o prédio parece uma fortaleza, cheio de grades e
trancas e só havia uma maneira dele estar fora do prédio, saindo pelo portão da
garagem junto com a entrada e saída dos carros, porém meu filhotinho é medroso
ao barulho de carro e descartei essa hipótese.
Pensei comigo tentativa nº 1: bater
de porta em porta, tentativa nº 2: pedir as filmagens das pouco acessíveis
síndicas (possivelmente teria que pedir na justiça), tentativa nº 3: falar com
todos no prédio, conhecidos, desconhecidos, visitantes, alguém tinha que ter
visto. Tentativa nº 4: cartazes e nº 5: internet.
Comecei com a tentativa nº 1: batendo
de porta em porta, mas preferi começar com as portas de donos de gatos, ninguém
resistiria a um miado. E eu bati na primeira porta e eis que o Kadu estava lá.
Já tinha virado Eduardo e só a mãe queria procurar o dono. As duas filhas
haviam decidido ficar com o meu Kadu. Ele passou 14 horas lá. A mãe pediu para
a filha avisar na portaria, mas a filha se recusou a avisar. A mãe já estava
sendo convencida a ficar com o Kadu. Ela quando viu minha cara de sofrimento
devolveu de boa. Falou das peripécias dele, do uso da caixinha de areia, do que
ele havia comido e como tinha se adaptado bem.
As meninas ficaram chorando, querem
visitá-lo sempre e eu consenti.
Final feliz para mim. Mas que susto
medonho, que tristeza profunda. Nada me confortava. Eu me senti péssima e mais
péssima ainda sem ter qualquer notícia se ele podia estar bem ou não.
Evitei coleirinha, ficava com dó e
medo de que machucasse, mas agora acho algo necessário.
Meu safado fujão, já estava amando
outra família.
A todas as pessoas que perderam seus
gatinhos. Não se desesperem. Mas atenção. Melhor prevenir do que remediar.
- Arcise Câmara
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