quinta-feira, 3 de abril de 2014

Mas era tarde demais



Era tarde demais para levar o lixo lá fora sem problema, era tarde para tentar enganar a minha revolta interior em estar infeliz, era tarde para se fazer de coitadinho apaixonado, era tarde para tentar ser amigo.
Ah, por que não uma reconciliação? Porque estou farta de segurar essa relação sozinha, minhas costas se desgastaram, minha paciência acabou, eu nem estava gostando tanto quanto antes, eu também não me sentia culpada por me sentir solteira novamente, estava com a mente saudável e com bastante energia.
Bati inúmeras vezes na mesma tecla, eu achava que havia encontrado o homem dos meus sonhos, o companheiro de jornada, um homem capaz de representar o papel de bom marido, que eu podia consultá-lo para qualquer coisa sem ser julgada, que pudéssemos viver na verdade e de verdade.
Muitos intrusos dominaram a nossa relação, era palpites de toda ordem, sogra, cunhada, sogro, cunhado, amigos, qualquer palpite parecia inofensivo, mas virava qualquer cabeça, tudo era imprevisível. A única previsibilidade eram as brigas constantes.
Ficamos despreocupados com a relação, empurrávamos com a barriga, parecia que nada romperia esse lar, estávamos infelizes e acomodados, de um jeito ou de outro, o fim era esperado.
Sabíamos que algumas pessoas prejudicavam nossa relação, pelo menos ter esta consciência era bom para nós, porém as provocações não cessaram e em meio ao caos e com o divórcio batendo na porta resolvi engravidar.
A experiência da gravidez foi um luxo! O momento era o meu preferido, na altura do campeonato eu nem me lembrava que eu tinha marido, ele reagiu de forma inaceitável, sentiu-se traído e desapontado, a gravidez não nos aproximou, ao contrário nos afastou ainda mais.
Olhos esbugalhados era sinônimo de princesinha recém-nascida, sono tranquilo só o dela, eu sempre tinha expressão de mãe abobada que vive num eterno paraíso com euforia de ganhadora da mega sena acumulada protegendo seu tesouro mais precioso.
Minha filha e eu nos tornamos amigas desde o primeiro olhar, eu me sentindo uma fortaleza e ela pequena, frágil, indefesa, com sorriso unicamente gengival e olhinhos azuis igual peteca.
Segundo Freud explica eu me sentia mais humilde, mais medrosa, mais predadora para defender minha cria, mais celestial e com bastante dificuldades em estabelecer rotinas, principalmente com a sua insistência de fazer xixi e cocô após banho tomado, frauda trocada e perfume desperdiçado, fazendo-me gargalhar de ódio.
Sorrir diante das frustrações era tão comum nessa fase, até as coisas ruins tinha um fundo bom, estranho né? Eu poderia discorrer horas sobre isso, mas posso resumir em uma única palavra: Amor.
Eu não sei ser mãe, ninguém me preparou para isso, mas eu parecia melhor não me apressei em ter todas as informações, não tripudiei em cima de mim para ser perfeita, não me rodeei de livros e sites a respeito, procurei apenas ser mãe o máximo de horas que eu podia, contextualizei todos os bons momentos, preparei com cuidado e dedicação o batismo.
Acredito que mais acertei que errei. Na minha relação com a minha filha, pessoas acostumadas a se meterem na minha vida também palpitaram, mas deixei ela se meterem o quanto quisessem e tomava minhas próprias decisões em parceria com a pediatra.
Meu casamento terminou, eu não tinha tempo para pensar nele, nem em desistir, ele percebeu que estava sobrando e se foi.
- Arcise Câmara
- Crédito de Imagem: http://noticias.bol.uol.com.br

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