quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Rancorosa que julga demais as pessoas


Joguei o capelo para o alto na formatura, estava acompanhada de um homem lindo, meu namorado Fabrício, cujo relacionamento ultrapassava dois anos, depois de quatro meses ele partiu para o céu num assalto no trânsito, chorei tanto que senti tristeza e a superação da perda demorou muito para acontecer, até hoje meus olhos transbordam quando lembro dos momentos felizes.
Foi um namoro raro e delicioso, uma pessoa amável, gentil, altruísta, um ser humano de dar gosto, nada o irritava chegava a ser até irritante sua paciência ilimitada.
Por várias vezes fui cínica tentando convencê-lo a não ser besta, ele nunca me deu ouvidos, abafava minha fala com um abraço, eu e outros amigos sempre organizávamos um motim, era aquela coisa toda para ele só ser bom com quem fosse bom com ele.
O segredo de sua felicidade era que ele já estava terminando de cumprir sua missão na terra, por muito tempo fingi que sua partida não me incomodou, fingi ter superado, vivia chorando escondida, vivia em baladas, mas na verdade eu tinha sede de tê-lo ao meu lado, tinha vontade de encontrar outro Fabrício para preencher a minha vida.
Faria tudo diferente, demonstraria meus sentimentos a cada minuto, deixava a censura pra lá, comprava logo um apartamento e ia viver de modo diferente, aconchegante, tipo casa da mãe,
Ele nunca deixou de me surpreender, era flexível e fácil de lidar, quase todos os dias, penso nele e quando esqueço os sonhos tratam de me lembrar.
No dia de sua partida acordei com mau pressentimento, molhada de suor mesmo estando num quarto pequeno com a temperatura em dezessete graus, não éramos namorados unha e carne, eu reclama de tudo, nada estava bom, eu dizia tudo que vinha na minha cabeça sem filtros, porém nosso amor era intenso e ele não desistia de mim.
Ele compartilhava amor por onde fosse, mesmo no trânsito horrível ele tinha a paciência de ceder a vez, porém morreu exatamente ao volante numa reação em legítima defesa.
Acho que ele tomou susto, não consigo  acreditar na versão do assassino, a minha vida estava sempre controlada, eu tinha a faculdade, o namorado, a saúde, um bom emprego, eu tinha o Fabrício e tudo caminhava para a felicidade plena.
A ansiedade tomou conta do meu estômago, engordei trinta quilos, fiquei sem capacidade de manter compromissos amorosos a longo prazo, passei a desvalorizar qualquer homem que eu enxergasse o mínimo de defeito.
Tornei-me passiva-agressiva, ninguém podia confiar em mim, até que um mundo de possibilidades se abriu enquanto eu estava tão cética que nem reconheci um cara legal quando ele apareceu, ele me pareceu uma pessoa de bom coração, mas parti seu coração com a infinita comparação com o Fabrício.
Recebi como consequência do meu temperamento inflexível e julgador a oportunidade de ser feliz e fazer a diferença na vida de alguém, ele era uma pessoa estimuladora enquanto eu engatinhava no quesito saber amar.
Com o tempo alguém veio me falar que ele me traiu, fiquei desconcertada, sem cor, minhas pernas tremeram e ficaram fracas, tudo era repentino, desmoronei , não fiz nenhum esforço para esconder meus sentimentos de rancor, raiva e revolta, porém com o passar dos anos a dúvida veio surgindo na minha vida e coloquei na minha cabeça dura  que eu preferia ter a imagem de Fabrício igual aos sentimentos e admiração que eu nutria por ele.
Arcise Câmara
Imagem We It


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