Joguei o capelo para o alto na
formatura, estava acompanhada de um homem lindo, meu namorado Fabrício, cujo
relacionamento ultrapassava dois anos, depois de quatro meses ele partiu para o
céu num assalto no trânsito, chorei tanto que senti tristeza e a superação da
perda demorou muito para acontecer, até hoje meus olhos transbordam quando
lembro dos momentos felizes.
Foi um namoro raro e delicioso, uma
pessoa amável, gentil, altruísta, um ser humano de dar gosto, nada o irritava
chegava a ser até irritante sua paciência ilimitada.
Por várias vezes fui cínica tentando
convencê-lo a não ser besta, ele nunca me deu ouvidos, abafava minha fala com um
abraço, eu e outros amigos sempre organizávamos um motim, era aquela coisa toda
para ele só ser bom com quem fosse bom com ele.
O segredo de sua felicidade era que
ele já estava terminando de cumprir sua missão na terra, por muito tempo fingi
que sua partida não me incomodou, fingi ter superado, vivia chorando escondida,
vivia em baladas, mas na verdade eu tinha sede de tê-lo ao meu lado, tinha
vontade de encontrar outro Fabrício para preencher a minha vida.
Faria tudo diferente, demonstraria
meus sentimentos a cada minuto, deixava a censura pra lá, comprava logo um apartamento
e ia viver de modo diferente, aconchegante, tipo casa da mãe,
Ele nunca deixou de me surpreender,
era flexível e fácil de lidar, quase todos os dias, penso nele e quando esqueço
os sonhos tratam de me lembrar.
No dia de sua partida acordei com mau
pressentimento, molhada de suor mesmo estando num quarto pequeno com a
temperatura em dezessete graus, não éramos namorados unha e carne, eu reclama
de tudo, nada estava bom, eu dizia tudo que vinha na minha cabeça sem filtros,
porém nosso amor era intenso e ele não desistia de mim.
Ele compartilhava amor por onde
fosse, mesmo no trânsito horrível ele tinha a paciência de ceder a vez, porém
morreu exatamente ao volante numa reação em legítima defesa.
Acho que ele tomou susto, não
consigo acreditar na versão do
assassino, a minha vida estava sempre controlada, eu tinha a faculdade, o
namorado, a saúde, um bom emprego, eu tinha o Fabrício e tudo caminhava para a
felicidade plena.
A ansiedade tomou conta do meu
estômago, engordei trinta quilos, fiquei sem capacidade de manter compromissos amorosos
a longo prazo, passei a desvalorizar qualquer homem que eu enxergasse o mínimo
de defeito.
Tornei-me passiva-agressiva, ninguém
podia confiar em mim, até que um mundo de possibilidades se abriu enquanto eu
estava tão cética que nem reconheci um cara legal quando ele apareceu, ele me pareceu
uma pessoa de bom coração, mas parti seu coração com a infinita comparação com
o Fabrício.
Recebi como consequência do meu
temperamento inflexível e julgador a oportunidade de ser feliz e fazer a
diferença na vida de alguém, ele era uma pessoa estimuladora enquanto eu
engatinhava no quesito saber amar.
Com o tempo alguém veio me falar que
ele me traiu, fiquei desconcertada, sem cor, minhas pernas tremeram e ficaram
fracas, tudo era repentino, desmoronei , não fiz nenhum esforço para esconder
meus sentimentos de rancor, raiva e revolta, porém com o passar dos anos a
dúvida veio surgindo na minha vida e coloquei na minha cabeça dura que eu preferia ter a imagem de Fabrício
igual aos sentimentos e admiração que eu nutria por ele.
Arcise Câmara
Imagem We It
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