segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Notícia Ruim


Cinco eternos minutos a espera de notícias, estou aflita, não consigo pensar em outra coisa, a doença está levando toda a minha paz de espírito, toda a certeza da cura. O sofrimento está se intensificando.
A espera é angustiante, cada segundo parece vinte e quatro horas, cada boletim é um coração saltado, cada visita do médico é a concentração para entender o diagnóstico sem a dramatização das emoções.
Nenhum deles diz uma palavra de conforto, o melhor é esperar, entregar nas mãos de Deus, rezar ou orar, meditar, fazer todas as declarações de amor possíveis aquela declaração que ficou na gaveta.
Ele me agarra de repente, quer se despedir, quer que eu seja feliz, não quer que eu chore pela sua partida, estou com lágrimas escorrendo pelo rosto, soluços e prantos, eu não quero deixá-lo ir.
Senti um desespero apaixonado em seu beijo, ele também não quer ir, é jovem, robusto, trinta e quatro anos, com uma vida pela frente, com projetos de mestrado, com o sonho de aumentar a família.
Eu fico aliviada com a sua vontade de viver, apesar das declarações de despedidas, dos gestos de adeus, o sinto lutando a cada minuto, lutando por mim, por nós, pela vida e pelo prazer de viver.
Ontem o médico falou que não há chances, o câncer se espalhou, as dores serão inevitáveis, a morte está próxima e diante daquela avalanche de notícias eu me recolhi, como posso perder o meu presente mais precioso?
Conversei com o mestre do universo, indaguei-o sobre os seus planos, o que ele queria de mim? O que ele queria de nós? Entreguei-me totalmente. Foi difícil mas precisava respeitar sua vontade.
Hoje me sinto muito melhor, não busco entender o que se passa e sim aceitar os fatos como eles são. Foge do meu entendimento tentar entender alguma coisa, os mistérios da vida e da morte não são desvendados nesta terra.
Minha melhor estratégia era viver bem cada minuto, viver aquela frase repetida quinhentas vezes: viva cada dia como se fosse o último. É assim que procuro viver no momento sem tantas preocupações.
Ele passou mal pela primeira vez após o diagnóstico, meus olhos se arregalaram, eu estava talvez mais nervosa que ele, estava aflita por dentro, fingindo uma força que eu não tinha, afirmando que as coisas iam melhorar sem eu ter a certeza disso. Mentindo para agradar meu desejo de que isso fosse verdade.
Tornamo-nos amigos, mais amigos ainda, uma espécie de encontro de almas, tudo tinha sentido, estávamos sintonizados na dor e no amor, estávamos felizes por passar por isso juntos, pela troca e cumplicidade de saber que ele tinha a mim e eu o tinha.
Quando ele foi desistindo de se alimentar e assim instalaram a sonda, tive voz enfática, xinguei, briguei, chorei, pedi que pelo amor de Deus que ele lutasse se não por ele pelo menos por mim, pela nossa família.
Eu não tinha o direito de dizer isso, eu não podia cobrar forças de alguém se eu mesma já estava sem forças, eu não podia exigir mais do que ele estava disposto a lutar, eu não podia pressioná-lo desse jeito, causando estresse.
Eu não tenho o direito de proibir nada, de tornar o ambiente pesado, eu não tenho o direito de tornar as coisas piores, eu não tenho o direito de desrespeitar sua vontade, a vontade de se entregar a partida.
Assim ele se foi, partiu com um tom sereno e amável, treze dias após a internação, partiu com sorriso no rosto, partiu materialmente mas se alojou dentro de mim. Não tenho dúvida que ele está presente no espaço. Está entre nós.
Aos poucos fui recuperando a rotina. Não é fácil! Ter que trabalhar com o coração em frangalhos, ter que sair de casa sem a menor vontade, ter que se concentrar quando os pensamentos e sonhos só remetem a lembrança dele.
Não vou brigar com ninguém que me diz que sou jovem, tenho uma vida pela frente, que vou encontrar outro amor, não vou brigar por pensamentos e palavras de pessoas que não respeitam meu recém-sentimento de perda. Não é hora de pensar em outro alguém, de fazer planos de casar de novo. O que você queria mesmo no momento era partir também e se casar no céu, com flores e velas, com Jesus e Maria como testemunhas.
Sinto seu cheiro delicioso no meu nariz, sinto seu perfume pela casa, sinto sua presença no meu cotidiano. Você se foi, eu o enterrei, joguei flores e terra em cima, mas é como se não tivesse ido. Está difícil se desacostumar.
Como de costume conversávamos após as refeições, como de costume íamos ao cinema semanalmente, como de costume dormia entrelaçada em seus braços, como de costume dividíamos despesas e afazeres domésticos.
Fique entediada, tudo perdeu o sentido, falta pernas, braços, complemento, falta a sensibilidade do seu carinho, do seu olhar. Tenho que entender o incompreensível, tenho que aceitar o rompimento, na certeza que um dia nos encontraremos.
Não quero ler nada de positivo no momento, não quero ouvir que foi da vontade de Deus, quero utilizar a negativa, a raiva para aliviar minha angustia, quero passar por todos os sentimentos e questionamentos até absorver tudo isso.
Vai em paz meu amor!
- Arcise Câmara
- Crédito de Imagem: http://blogs.diariodepernambuco.com.br

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