É difícil
interpretar o outro, é difícil entender um pseudo-religioso, é difícil fingir
ser séria e incontestável, a verdade antes vem à tona, nenhuma palhaçada é
eterna, eu nunca me dei ao trabalho de questionar se as pessoas são felizes de
verdade.
Ela está
sempre crivada de hematomas, não esquenta com nada, seus pontos e vírgulas
estão no mesmo lugar, sente-se orgulhosa demais para a família que construiu.
Deixou aos
poucos de ser jovial, tornou-se passível de investidas desumanas, socos,
pontapés, chutes na barriga, nunca decidiu se libertar, evitava participar de
confraternizações com os olhos roxos, estava sempre com o sorriso maravilha de
sempre.
Todo mundo
comentava que homens traem, que homens desrespeitam, que homens mandam ver,
mandam brasa, cresceu com a percepção distorcida de igualdade e justiça.
Durante as
férias eu quis distância dessa amizade, sofria com suas mentiras, suas
desculpas, seu jeito de honrar a família, dói em mim ver a vida passando para
ela, dói a ver passando e você representando o papel de mulher perfeita, de
sabedora da moral e dos bons costumes.
Me explica
essa história direito que eu não estou entendendo, o que faz um “felizes para
sempre” desse jeito, para mim felicidade é igual passagem de ano novo, um
ritual igual para todo mundo, mesmo com expectativas diferentes, sentimentos
bons ou ruins, sensação de reflexão ou não, parte da rotina ou incutida pela
sociedade cheia de regras.
Sei lá, não
consigo conviver com sujeitos de lua, ou de gente que acha que não foi amada
suficiente quando criança, ou ainda que precisa superar a ingerência de alguém,
ou homens que acham que podem fazer tudo, inclusive bater e as esposas tem que
aceitar.
Amor ambíguo,
todo mundo feliz, pretextos para cada perdão, enquanto você é tratava com
pétalas de rosa após um surra horrorosa. Calma! Calminha! Faz parte de sua
natureza se arrepender e fazer de novo, se arrepender e mais uma vez, se
arrepender e ouvir caladinho um sermão de que aqui não é casa da mãe joana e
que as coisas serão diferentes de hoje em diante... Até a próxima porrada.
Desculpa se
fui indelicada, todo dia eu me perguntava cadê a coragem de dizer as minhas
verdades, cadê a minha humildade em aceitar o que de fato ela aceita para si
mesma, cadê o meu inconsistente que não me deixa deixar pra lá.
Às vezes a
sinto pela metade, por vezes descarregou suas necessidades em mim, jogava a
sujeira no ventilador quando estava saturada, mas depois contava outras versões
e jurava de pé junto que jamais falou algo do tipo e é capaz de me chamar de
louca.
Por motivos
que eu desconheço ela vive essa vida e garanto que ela não é infeliz o tempo
todo, mesmo desse jeito amador, mesmo sendo grossa comigo, mesmo me mandando eu
não me meter eu matava no peito e engolia o sapo.
Ela era uma
mulher forte e não se deixava vencer, era uma decisão para peixe grande colocar
a família em primeiro lugar, sem rifar ninguém ou rifando a si mesma. O sangue ferve
para defender o amado, cheiro forte digno de amor me invadiu, sendo freada o
tempo todo é assim o que ela sente por felicidade.
Já me poupei
de crises de nervos, as coisas não são
oito ou oitenta, podemos muito bem separar as coisas, sem nos enfezar ao
extremo, sem gesticular bastante, sem jogar um jogo de vida ou morte em que a
pancada possa ser irreversível, sem achar que nunca vai morrer, sem acreditar
que aos poucos ele se cansa de bater e principalmente sem fingir um sorriso que
não convence ninguém, nem a si mesma.
Arcise
Câmara
Imagem We It
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