Eu me negava
a admitir que poderia ser uma menina, todo mundo me desejava que viesse com
saúde, perfeito, feliz, eu desejava apenas ser mãe de menina, eu tinha nome,
sonhos, fórmulas...
Se viesse
menino não seria rejeitado, não seria menos amado, não seria desprazeroso, só
não seria o meu desejo pessoal de maternidade.
Ora, externar
esse desejo era feio, ingrato, sacana com um serzinho que estava dentro na
minha barriga pensava todo mundo.
Sem esconder
a vergonha por tantas críticas, de certa forma eu compreendo a cabeça de cada
um, dos defensores e punidores, cada um representando um papel de como deveria
ser o sentimento de uma mãe por um ser sem sexo definido por ultrassom.
Senti a mente
deles se abrindo a novas ideias e possibilidades, ao entendimento de um desejo
de ser mãe de menina, mãe de princesa, mãe de frufrus e eu tornei-me
inseparável dos argumentos apenas internos de minhas manias e vontades.
Teve gente
que se ressentiu, teve gente que se corroeu internamente e até deixou de falar
comigo, deve gente que me julgou, disse que coisa boa não é, pois é, eu poderia
ter abafado meus desejos, poderia ter ficado na minha aguardando ansiosa o
resultado das frustrações, poderia ter ficado encafifada com as perdas dessa
revelação, mas os meus sentimentos eu tenho que abafá-los, o meu amor não vai
mudar, o meu beijinho será o mesmo, minha dedicação será exclusiva.
Quantas mães
querem porque querem filhos de algum sexo específico e enchem a casa parindo
até que o sonhado chegam, conheço mulheres com oito filhos homens, conheço
famílias com quatro homens em casa, essas pessoas não queriam uma família
numerosa, queriam apenas ter filhos daquele determinado sexo e foram tentando,
tentando...
Eu sei que
não satisfiz os rigorosos padrões da maternidade, mas que Diacho de mundo é
esse que não podemos expressar opiniões, sem as lamentações e indelicadezas
batendo a sua porta.
Que tal se
eu retribuísse todas as críticas com um jantarzinho de “não quero que você me
compreenda, basta você me respeitar”.
Seria
maravilhoso reunir seiscentos amigos, dos quais boa parte não querem mais olhar
na sua cara, detestam ter de encarar uma pessoa “tão cruel” com naturalidade.
Enfim, vamos
botar isso no passado, pois a menina nasceu, se chama Ceres, é linda, risonha,
fofa, talvez já tenha nascido com todo o amor que sempre reservei para ela,
talvez eu soubesse que precisava viver dessa forma, talvez eu perdesse para
sempre o respeito das pessoas se tivesse vindo um meninão, eu poderia estar
ficando louca, admitiria por medo de causar traumas profundos no bebê.
Apesar de
não haver ameaça evidente entre um desejo e uma obstinação, é apenas um destino
óbvio que se encaixa em mim, na minha vida, no meu estilo, é apenas a vida me
ensinando a driblar as pressões e opiniões alheias, é apenas a onda do momento
em reagir ou reclamar, é a eterna preocupação com a vida que não nos interessa,
é o péssimo costume de xeretar e invadir o íntimo do outro.
Agora eu
tenho outro desejo, ser mãe de menino, porque a “trágica” realidade é que
podemos e devemos se quisermos, mudar de opinião, abranger outros conceitos,
ampliar o coração e um desejo antigo de ser mãe de filha única se dissipou,
como canta o Lulu “nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia...”.
Muita gente
pensa como eu só não evidencia, muita gente tem até pressentimentos sobre o
sexo do bebê, mas não revela, eu me tornei bastante seletiva na hora de falar?
Não! Meu marido deixou de gostar de mim por ser assim? Não! Era e sempre foi um
projeto sem base, apenas um desejo e eu posso desejar o que eu quiser.
Arcise
Câmara
Imagem We It
Nenhum comentário:
Postar um comentário