sábado, 31 de maio de 2014

Afirmou irônico


Para eu não me perder na leitura eu não entendi muito bem o que ele quis dizer, sou do tipo que preciso olhar nos olhos para entender o que se fala. Parei a leitura e ouvi atentamente o discurso de que somos todos adultos, que se eu quisesse ir embora ninguém ia me impedir. Nós nem brigamos, nem nada. Esse papo surgiu do nada, como se ele quisesse me dar a decisão da partida ou da culpa.
Eu só sei que estava cansada de ironias.  Ai, meu Deus, mas a probabilidade de eu conseguir tomar uma decisão definitiva era mínima, então por incontáveis vezes eu me separei e voltei. Ele sempre apostou no mais óbvio que era a certeza do meu amor quase incondicional.
Manda ver ele falava sempre a cada “decisão”, com a certeza que não mexeria nem na nossa conta bancária conjunta em que nessa relação de unificação eu saia perdendo sempre. Assim cheguei aos quarenta anos, cheia de ameaças e poucas atitudes e a vida era a mesma de muito tempo.
Fui feliz em vários sentidos e fui infeliz em áreas restritas a talvez essenciais, desvendei os bastidores do meu mundo infinitas vezes, nunca soube tirar proveito das oportunidades que me apareciam, sempre me humilhava por coisas pequenas, nem sempre ele me levava à derrota, às vezes eu mesma fazia isso, sem perceber.
Nunca usei o bom senso para sobreviver, nunca me senti verdadeiramente útil, nunca ganhei destaque em nada que fiz, os destaques eram só para aquilo que eu deixei de fazer, ele nitidamente criticava tudo e eu numa tentativa desesperada de autopreservação eu me esforçava cada vez mais.
No ponto de vista histórico eu não seria nem a primeira e última a viver assim, num casamento de aparências, sem consequências diante dos outros e realizando o sonho do até que a morte nos separe com a maior mediocridade que existe na face da terra.
Resolvi pensar em mim. Desenvolvi um projeto na área social, criei novidades em centros de apoio, desbravei ideias engavetadas, reinventei causos de sucesso, refiz projetos que andavam e não sei por qual motivo estagnaram , descobri que sou útil e eficiente, implantei técnicas de controle...
Enfrentei muitas dificuldades no recomeço, como em toda a mudança, depois de quatro anos nesse projeto comecei a sentir-me realizada. Eu tinha uma liberdade conquistada. Ele tentava disfarçar sua insuficiência profissional com regras descabidas dentro de casa, mas ele não me atingia mais. Eu resolvi acreditar em mim. Eu resolvi ser feliz ajudando quem necessitava, eu me especializei em fazer os outros felizes e com isso ganhei felicidade, plena felicidade.
- Arcise Câmara
- Crédito de Imagem: http://www.jb.com.br

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