Para eu não me
perder na leitura eu não entendi muito bem o que ele quis dizer, sou do tipo
que preciso olhar nos olhos para entender o que se fala. Parei a leitura e ouvi
atentamente o discurso de que somos todos adultos, que se eu quisesse ir embora
ninguém ia me impedir. Nós nem brigamos, nem nada. Esse papo surgiu do nada,
como se ele quisesse me dar a decisão da partida ou da culpa.
Eu só sei que
estava cansada de ironias. Ai, meu Deus,
mas a probabilidade de eu conseguir tomar uma decisão definitiva era mínima,
então por incontáveis vezes eu me separei e voltei. Ele sempre apostou no mais
óbvio que era a certeza do meu amor quase incondicional.
Manda ver ele
falava sempre a cada “decisão”, com a certeza que não mexeria nem na nossa
conta bancária conjunta em que nessa relação de unificação eu saia perdendo
sempre. Assim cheguei aos quarenta anos, cheia de ameaças e poucas atitudes e a
vida era a mesma de muito tempo.
Fui feliz em
vários sentidos e fui infeliz em áreas restritas a talvez essenciais, desvendei
os bastidores do meu mundo infinitas vezes, nunca soube tirar proveito das
oportunidades que me apareciam, sempre me humilhava por coisas pequenas, nem
sempre ele me levava à derrota, às vezes eu mesma fazia isso, sem perceber.
Nunca usei o bom
senso para sobreviver, nunca me senti verdadeiramente útil, nunca ganhei
destaque em nada que fiz, os destaques eram só para aquilo que eu deixei de
fazer, ele nitidamente criticava tudo e eu numa tentativa desesperada de
autopreservação eu me esforçava cada vez mais.
No ponto de
vista histórico eu não seria nem a primeira e última a viver assim, num
casamento de aparências, sem consequências diante dos outros e realizando o
sonho do até que a morte nos separe com a maior mediocridade que existe na face
da terra.
Resolvi pensar
em mim. Desenvolvi um projeto na área social, criei novidades em centros de
apoio, desbravei ideias engavetadas, reinventei causos de sucesso, refiz
projetos que andavam e não sei por qual motivo estagnaram , descobri que sou
útil e eficiente, implantei técnicas de controle...
Enfrentei muitas
dificuldades no recomeço, como em toda a mudança, depois de quatro anos nesse
projeto comecei a sentir-me realizada. Eu tinha uma liberdade conquistada. Ele
tentava disfarçar sua insuficiência profissional com regras descabidas dentro
de casa, mas ele não me atingia mais. Eu resolvi acreditar em mim. Eu resolvi
ser feliz ajudando quem necessitava, eu me especializei em fazer os outros
felizes e com isso ganhei felicidade, plena felicidade.
- Arcise Câmara
- Crédito de
Imagem: http://www.jb.com.br
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