Não importa a sua idade, o que você já
viveu, se o seu nome está limpo na praça e quanto a balança da farmácia acusa
toda vez que você sobe nela. Uma coisa é certa: toda mulher já idealizou um
amor. Na verdade, acho que todo mundo já teve lá suas fantasias.
Homens e mulheres já pensaram nas
qualidades que gostariam que suas mulheres e homens tivessem. Quero um cara que
me entenda, que me ouça, que tenha alguma beleza, que use cintos decentes, que
não ajeite a cueca no meio da rua, que saiba falar italiano e que goste de
arte. Quero uma mulher que tenha bons peitos, saiba fazer sushi, goste de rock,
curta um filminho pornô e saiba rir. Cada um idealiza de um jeito. Até que a
realidade bate forte na nossa porta.
É claro que eu tinha sonhos e uma lista
extensa. Queria que fosse moreno, tivesse olhos claros, fosse alto, tivesse
braços fortes, soubesse cantar, me fizesse rir, gostasse de cachorro, soubesse
cozinhar, fosse carinhoso, atencioso e me escutasse. Meu marido não é igual a
essa lista, ou seja, ele não é o marido dos sonhos. É moreno, tem os olhos
claros, tem a minha altura, tem braços fortes, não canta, mas toca violão e
guitarra, me faz rir, passou a gostar mais de cachorro depois de me conhecer,
não sabe cozinhar, mas prepara ótimos drinks, é carinhoso, atencioso e me
escuta. De vez em quando. É que ele pertence ao gênero masculino, ou seja, não
consegue prestar atenção em tudo que eu digo, pois falo rápido e mudo de
assunto a todo instante. Apesar disso, sei que ele tenta me acompanhar. Além
disso, ele é dono de um humor que chega a me assustar de tão bom. Juro que
nunca vi pessoa mais bem humorada. Mas ele também é ranzinza, cheio de manias,
meio mimado, gosta de tudo do jeito dele, rói as unhas e tem mais um monte de
defeitos. É que ele é de carne e osso, é gente. E gente é assim, se é que você
me entende.
Crescemos com uma ideia na cabeça. A
vida inteira é assim, até que a gente se depara com o amor. E agora? E agora
você abandona tudo que achou, tudo que sonhou e começa a sonhar junto. É muito
mais legal, muito mais excitante, muito mais divertido, muito mais
perigoso.
O amor não tem fórmula, mas eu acho que
o amor tem que fazer rir, tem que ter graça. A graça tem que entrar na hora em
que as coisas ficam mais pesadas, mais sérias, mais sem saída. É que nem sempre
tudo é bom e caminha bem. O amor de vez em quando anda na corda bamba.
Ele tropeça, quase cai, mas fica em pé. Porque ele precisa ser trabalhado, não
basta amar e pronto. O amor tem rotina, tem ronco, tem louça suja, tem conta
que vence, tem tapete do banheiro molhado, tem tampa da privada levantada, tem
bagunça no meio da sala, tem roupa pra lavar, tem cocô do cachorro pra juntar,
tem ciúme, tem briga, tem sujeira, tem toalha molhada na cama, tem comida no
forno, tem copo vazio na mesa de centro, tem discussão por besteira, tem calor,
tem frio, tem sede, tem fome.
Amar não é nada fácil, apesar do amor
ser simples. O amor é construção. E é justamente por isso que a gente deve
esquecer tudo que aprendeu, tudo que imaginou e começar do zero. E recomeçar
todo santo dia. Porque o amor é isso: um eterno recomeço.
Clarissa Corrêa
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