Eu era a pessoa mais bem-humorada do universo, respeitava
meu ponto de vista, depois fiquei um pouco maluca do nada. Parei de me
meter em confusões, achava que quando dois brigavam a culpa era dos dois porque
quando um não quer, dois não brigam.
Estou tentando viver sem meu filho, nunca imaginei passar
por esse sofrimento, qualquer coisa me deixa a zero, mas nada me fez perder o
gosto pela vida do que sua partida.
Apertei o passo naquele dia, sabia que algo ruim estava
acontecendo, eu sentia. Não prestei atenção em mais nada, só queria voltar para
casa o mais rápido possível. Muitas pessoas se encarregaram do que abandonei,
fizeram muito por mim, me tiraram da lama várias vezes.
O mal-estar nascia de qualquer detalhe, qualquer lembrança,
eu tinha um trabalho a zelar e fazer e não tinha cabeça. A minha vida foi
decidida por esse acontecimento. Eu não conseguia seguir em frente.
Um dia apreciei por minutos um céu estrelado e sem nuvem
com uma lua gigante e foi meu primeiro momento indescritível. Não desprezei
nenhum detalhe e aquela contemplação me deixou bastante feliz.
Durante muito tempo ou estava dormindo ou estava delirando,
acreditava que tudo não passava de um pesadelo e que ao acordar estava tudo do
jeito de antes. Era conhecida por fazer o bem e agradar a todos, mas me fechei
em mim mesma.
Eu não queria ficar sozinha, tinha nascido para ser mãe,
mas agora eu só era mãe no plano espiritual. Eu era amada, bajulada. Várias pessoas
me apresentaram o caminho da bondade, do desapego, da religião, mas eu sempre
desistia, era fraca para lutar.
Sempre fui atenciosa com os outros e fazia descaso de mim mesma.
Nem fome sentia mais, aquela agradável sensação maravilhosa ao comer não
existia mais.
Recebi telefonemas, abraços, elogios, carinho e até bronca
por chorar demais. Reconheço que os amigos e familiares são peças chaves para
que a gente saia do fundo do poço, eles fazem todas as coisas que acham que são
boas para nós e muitas vezes erram querendo acertar e outros tantão de vezes salvam
a nossa vida literalmente.
Não desperdice nenhuma oportunidade de agradar quem você
ama. Não importa se é criança, bebê, jovem, não caia no conto que você vai
morrer primeiro.
As orações eram constantes, eu precisava criar laços
afetivos para me manter viva e lúcida e por vezes ficava só respirando o dia
inteiro para fugir de mais uma crise de ansiedade.
Quando encontrei o amor, duvidei se era realmente comigo
que ele queria estar. Eu só falava do meu único amor, dos objetos que me
lembravam ele, das aventuras que vivemos.
Eu sempre escolhi viver na paz, mas existia a violência
dentro de mim, a revolta interna quanto aos mistérios da vida, quanto seus
motivos. Vivi de tudo, ninguém gosta de ser bruta, tem tanto anjo na terra
sendo reverenciados até por pessoas de outras religiões.
Tanta gente humilde que nem parece letrada para falar com
os humildes, eu não poderia nem deveria desumanizar meu próprio ser.
Eu era desagradável porque não consegui dizer sim a vida da
forma como ela se apresentou, tinha que acabar o choramingo e lutar. O amor do
próximo para comigo me ensinou muitas coisas. Foram só coração, sem
desistências.
Aprendi grande ensinamento: O homem põe e Deus dispõe. Tinha
que decidir entre viver ou sobreviver. Eu estava jogando sujo comigo mesma, eu
achava que desgraça só acontecia com pobres e que a burguesia estava livre de
tudo.
O mundo é cheio de pessoas dispostas a salvar sua vida e
jamais pensei que separação e saudades pudessem ser vencidas pelo amor.
Arcise Câmara
Imagem: letras
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