Preciso
partilhar uma história com vocês. Minha sobrinha mais velha tinha por volta
de uns quatro ou cinco anos quando quebrou o micro-ondas deles.
Constatado
que o eletrodoméstico não funcionava, ela virou-se para a mãe e,
preocupadíssima, comentou: “Mas, e aí, mamãe? A gente não vai mais poder
fazer a mamadeira (da irmã mais nova)!”. Nunca ela tinha visto alguém aquecer
leite na panela, ao fogão. Do alto de sua reduzida experiência de vida, a
situação parecia incontornável.
Essa
sobrinha, na mesma época, foi quem me ajudou a dar os primeiros passos
efetivos no uso do computador. Cheia de fantasias parcialmente embasadas, eu
tinha medo de dar um comando errado e estragar a máquina ou o trabalho em
execução! Por meio das mãos confiantes e desinibidas da guria, aprendi a usar
um programa para desenhar, o trisavô do Paint. E “brincar de aula de
informática” com ela me auxiliou a desfazer um não tão antigo trauma.
Poucos anos
antes, havia sido desastrosa minha parceria com um colega ao rodarmos no DOS
um programa de banco de dados que organizaria a pré-matrícula de nossos
alunos da universidade. Conseguimos deletar horas de nosso trabalho árduo com
apenas um ou dois cliques indevidos. O computador era um modelo TK85, cujos dados eram registrados numa fita
cassete inserida num gravador. Foi um desastre perder as informações
armazenadas. Passei a achar que essas máquinas não haviam sido delineadas
para criaturas jurássicas como eu.
As histórias se entrelaçam se pensarmos o seguinte: a menina desconhecia a prática antiga do uso do fogo para esquentar o leite e pensava não haver solução. Eu desconhecia a faceta amigável dos novos computadores e ficara congelada, imobilizei-me na tecnofobia. O caso dela era apenas de desconhecimento, não tivera tempo para conhecer os meandros da cozinha, era pequena demais para dominar o fogão. Sua mãe a protegera dos perigos de queimaduras, então a pequena sabia reproduzir apenas o que via sua mãe fazer todos os dias, mamadeiras no micro-ondas.
Conhecer a
história nos ensina muito, aprendemos a resolver melhor os problemas se temos
acesso a dados do passado. Como se aquecia mamadeiras antes do advento do
micro-ondas?
Por outro
lado, quão adaptativo seria ficar congelada ao primeiro insucesso no manejo
de uma tecnologia nova?
Afinal de
contas, se borracha é companheira inseparável do lápis é porque está previsto
que errar faz parte do escrever. Um sem-fim de descobertas científicas foi o
sucedâneo de erros em série. Variar o comportamento, experimentar
alternativas, persistir, carregar os erros consigo, com leveza e tolerância,
tudo parece ajudar aos que precisam aprender a errar para ao final
conseguirem acertar.
Quem se cala,
temeroso de cometer equívocos, dificilmente dará conta de aprender um novo
idioma na vida adulta. Ao novo precisamos abrir espaço, no corpo, no coração,
na mente, na sala de estar de nosso ser. Sejam, então, bem-vindos ao
estranhamento, ao frio na barriga e ao medo de errar.
Por hoje é
isso, proponho termos curiosidade com nossa história, aprendermos com os que
chegaram antes de nós e, ao mesmo tempo, acho que só vive de verdade quem
está aberto ao novo, e dele experimenta, com gosto por ampliar seus
repertórios para interagir com um mundo em constante transição.
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Regina Wielenska
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