Amigos que não
sabem consolar com palavras, não conseguimos resolver imediatamente a vida
quando acabamos de perder quem amamos, não há chances de voltar atrás, não há
razões para sorrir, o espaço é apenas para chorar e depositar flores.
Passa um filme
com uma memória seletivas só das qualidades, a pessoa é vista como a melhor
pessoa do mundo, única e que desempenhou bem sua missão nessa terra, sem
necessidade de perder a cabeça à toa, sem a teoria dos apegos, com a diferença
notável de bom cidadão.
Custei a me
socializar novamente, culpei-me por não ter vivido intensamente, foi um pouco
chato ter pendências afetivas com o pai, a mãe, atitudes que jamais
esqueceremos, mesmo que com o tempo nos desinteressam pela culpa.
O perdão nos faz
refletir e até mudar caminhos, despachar a culpa de férias é dar o troco e
mover para seguir em frente, todo coração é um guia, o mundo conspira em
sintonia com nossos desejos.
Máscaras sociais
não nos fazem feliz, nem sempre somos intencionalmente enganados, o compromisso
e o amor também provocam cegueiras, nem sempre o que queremos significa paz,
amor, tranquilidade e perfeição.
A culpa nos faz
ter sentimentos de inferioridade, a morte pode acontecer subitamente com
qualquer um, as coisas mudam, mas nem sempre de verdade, assumir as
responsabilidades de ser eu mesma, não sucumbir as tentações, evitar o controle
e me sentir importante mesmo em frangalhos.
Comecei a levar
trabalho para casa, precisava me sentir útil, presente, viva, conversar
abertamente sobre o meu parceiro que acabava de partir de vez, acostumar-me sem
sua presença, aprender mais uma lição de vida.
Prometi muitas
coisas e não cumpri, deixei de ser popular, tornei-me mil vezes mais afetuosa,
não por bondade e sim por medo do remorso, não conhecia bem a mim mesma, não
sabia que junto com a morte de quem amamos a gente morre junto um pouquinho,
faltava consciência para essa certeza da vida.
Aceitei que as
criaturas vêm e vão, que é uma tremenda sensatez viver intensamente sempre
invadida por uma sensação de felicidade dando importância as coisas importantes
e deixando em quarentena pensamentos inúteis e condutas não colaboradoras.
Sempre fui
mulherzinha, agora precisava aprender a ser forte, a controlar emoções, a
correr riscos dos julgamentos, as decepções de quem acha que sabe o que devo
fazer, os sonhos frustrados de quem se aproximou por curiosidade.
Eu vivi o amor
verdadeiro, eu não discrimino quem não se entrega ao amor, eu não sei viver com
hostilidade e desdém, sou fã de generosidade, não curto representar um papel,
mesmo que sejam tendências coletivas.
As pessoas
sentem atração por quem compartilha suas atitudes, ficam inquietas com quem
pensa diferente, não abro mão do que existe de melhor na minha vida que é minha
paz de espírito, meus valores, minha “modernidade”, meus fundamentos talvez
diferentes da maioria, sem pânico, aceitando o meu destino.
As crises vieram
em etapas, voltei a me envolver com a família, não aguentava mais tanta
pressão, de um lado a esperança de um novo casamento, do outro, a desesperança
em encontrar alguém parecido num mundo de desiguais.
Estava com um
vazio no coração, nada igual ao que algum dia eu teria sentido, era uma
separação permanente, com rapidez e sem descansos. Eu era cortejada por todos,
inclusive pelo consumo.
Vários
relacionamentos eram reatados o meu não tinha essa possibilidade, só se eu
morresse, só se a vida acabasse, sem me entregar e crescer no meu destino.
Arcise Câmara
Imagem: Monique Griguc
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