quinta-feira, 4 de junho de 2015

Se deixarmos crescer


É mais confortável achar que o nosso filho não incomoda, somos da época da não palmada, da não violência, vamos embora se nosso filho recebe críticas, estamos num estado em que nos inflamamos fácil.
Não há muitas certezas sobre criação de crianças, somos melhores pais que os outros, não concordamos com muitas coisas que alguém nos diz, achamos que vivemos sem mediocridades, sem a prisão do preconceito.
Crianças de hoje em dia não acordam cedo, não curtem uma bela manhã, não sabem brincadeiras de rua, seus corpos são tensos, encurvados de tanto mexer em tecnologias, o mundo está muito igual, não há diferenças entre crianças e adultos.
Meus pais mantinham os pés na porta e livre acesso aos nossos quartos, não podíamos mudar de ideia sem avisá-los, compraram muitos brinquedos com esforço, soa elegante para mim hoje, mas eu não percebia o quanto o consumo entusiasma enquanto as alegrias que guardo na minha memória nenhuma me faz lembrar qualquer brinquedo caro que ganhei.
Crianças se sentem abandonadas quando demoram a serem buscadas na escola, se sentem ridículas quando estão fora do padrão corporal e os pais tem o dever social de combater essa hostilidade de um padrão ditado pela mídia.
Crianças amam jogos de memória que vem na embalagem de gelatina... É sempre arriscado dar conselhos para pais, temos solução fácil para todos os problemas desde que sejam dos outros, temos um sentimento de vazio e decepção quando é o nosso problema.
Não somos superiores, mas somos os melhores pais do mundo, mesmo com mal-entendidos, com equívocos, com acidentes que poderiam ter sido evitados e poupados os filhos de gessos e pontos, mesmo que sejamos relativamente normais.
As coisas então perdem valor quando os filhos vão crescendo de forma desordenada, numa dependência afetiva, numa felicidade que só consiste em ‘encontrar alguém’, numa vontade de agradar o mundo com as coisas boas que nos acontecem, tentando preencher um vácuo emocional no consumo.
Não posso tirar as máscaras do mundo, não posso afirmar que o mundo é bom, às vezes fico cansada e perco o interesse, às vezes tenho desejos legítimos de felicidade e amor maternal, às vezes me sinto como se não pudesse confiar em ninguém.
Sou capaz de ver bondade, mesmo que as coisas fiquem lentas, mesmo que eu esteja apressada, mesmo que para maioria das pessoas nada importa, mesmo com opiniões diferentes, desejos não realizados, maneira de falar um pouco áspera.
Sou uma mãe instantânea e intuitiva, tenho horários de trabalho e por isso flexibilizo educação, sou gorda e pouco atraente, faço coisas diferentes, sempre busco o algo a mais, nunca julgo os erros dos meus filhos, não quero corrigi-los com culpa e sim corrigi-los apenas. Não curto palavras absolutas como sempre ou nunca como as que acabei de citar.
Eu trabalho tanto, mais tanto, tenho paixão pelo que faço, tenho estímulo visual, gosto do belo, do apresentável, sei dos defeitos que consigo eliminá-los, sei dos meus alertas de melhoria, curto esportes de alto risco, mas com meus filhos não.
Adotei uma abordagem prática em vez de moral, preocupei-me com as consultas ginecológicas e psicológicas ao invés de tentar investigar se os filhos já crescidos mantém vida sexual ativa, nunca me senti desconfortável em conversar com eles apesar de ter certeza de que havia segredos que mãe não deveria saber.
Ocupo a vida dele para que não tenham ócio, não me interesso ou me preocupo se vão mudar de religião quando estiverem adultos, quero pessoas do bem, com bom coração não em religião institucionalizada.
Pedi ajuda, não fui orgulhosa, por tempos eduquei meus filhos sozinha enquanto a função do pai na visão dele era por dinheiro em casa, agora, filhos criados, espero não ter errado tanto, sei que errei aqui ou ali, espero ter tido todas as falhas, menos as de caráter.
Arcise Câmara

Imagem: Depois que você se foi

Nenhum comentário:

Postar um comentário