É mais
confortável achar que o nosso filho não incomoda, somos da época da não
palmada, da não violência, vamos embora se nosso filho recebe críticas, estamos
num estado em que nos inflamamos fácil.
Não há muitas
certezas sobre criação de crianças, somos melhores pais que os outros, não
concordamos com muitas coisas que alguém nos diz, achamos que vivemos sem
mediocridades, sem a prisão do preconceito.
Crianças de hoje
em dia não acordam cedo, não curtem uma bela manhã, não sabem brincadeiras de
rua, seus corpos são tensos, encurvados de tanto mexer em tecnologias, o mundo
está muito igual, não há diferenças entre crianças e adultos.
Meus pais
mantinham os pés na porta e livre acesso aos nossos quartos, não podíamos mudar
de ideia sem avisá-los, compraram muitos brinquedos com esforço, soa elegante
para mim hoje, mas eu não percebia o quanto o consumo entusiasma enquanto as
alegrias que guardo na minha memória nenhuma me faz lembrar qualquer brinquedo
caro que ganhei.
Crianças se sentem
abandonadas quando demoram a serem buscadas na escola, se sentem ridículas
quando estão fora do padrão corporal e os pais tem o dever social de combater
essa hostilidade de um padrão ditado pela mídia.
Crianças amam
jogos de memória que vem na embalagem de gelatina... É sempre arriscado dar
conselhos para pais, temos solução fácil para todos os problemas desde que
sejam dos outros, temos um sentimento de vazio e decepção quando é o nosso
problema.
Não somos
superiores, mas somos os melhores pais do mundo, mesmo com mal-entendidos, com
equívocos, com acidentes que poderiam ter sido evitados e poupados os filhos de
gessos e pontos, mesmo que sejamos relativamente normais.
As coisas então
perdem valor quando os filhos vão crescendo de forma desordenada, numa
dependência afetiva, numa felicidade que só consiste em ‘encontrar alguém’,
numa vontade de agradar o mundo com as coisas boas que nos acontecem, tentando
preencher um vácuo emocional no consumo.
Não posso tirar
as máscaras do mundo, não posso afirmar que o mundo é bom, às vezes fico
cansada e perco o interesse, às vezes tenho desejos legítimos de felicidade e
amor maternal, às vezes me sinto como se não pudesse confiar em ninguém.
Sou capaz de ver
bondade, mesmo que as coisas fiquem lentas, mesmo que eu esteja apressada,
mesmo que para maioria das pessoas nada importa, mesmo com opiniões diferentes,
desejos não realizados, maneira de falar um pouco áspera.
Sou uma mãe
instantânea e intuitiva, tenho horários de trabalho e por isso flexibilizo
educação, sou gorda e pouco atraente, faço coisas diferentes, sempre busco o
algo a mais, nunca julgo os erros dos meus filhos, não quero corrigi-los com
culpa e sim corrigi-los apenas. Não curto palavras absolutas como sempre ou
nunca como as que acabei de citar.
Eu trabalho
tanto, mais tanto, tenho paixão pelo que faço, tenho estímulo visual, gosto do
belo, do apresentável, sei dos defeitos que consigo eliminá-los, sei dos meus
alertas de melhoria, curto esportes de alto risco, mas com meus filhos não.
Adotei uma abordagem
prática em vez de moral, preocupei-me com as consultas ginecológicas e
psicológicas ao invés de tentar investigar se os filhos já crescidos mantém
vida sexual ativa, nunca me senti desconfortável em conversar com eles apesar
de ter certeza de que havia segredos que mãe não deveria saber.
Ocupo a vida
dele para que não tenham ócio, não me interesso ou me preocupo se vão mudar de
religião quando estiverem adultos, quero pessoas do bem, com bom coração não em
religião institucionalizada.
Pedi ajuda, não
fui orgulhosa, por tempos eduquei meus filhos sozinha enquanto a função do pai
na visão dele era por dinheiro em casa, agora, filhos criados, espero não ter
errado tanto, sei que errei aqui ou ali, espero ter tido todas as falhas, menos
as de caráter.
Arcise Câmara
Imagem: Depois que você se foi
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